Carros blindados e almas nem tanto.

Não há novidade no que vou dizer, mas me senti inclinado a escrever mesmo assim.

Ao saber da notícia de que um estudante havia sido baleado na cabeça por assaltantes na USP, fiquei pensando sobre um detalhe que me deixou mais triste com a situação: O carro do rapaz ao que soube estava blindado, e segundo seus pais ele teria dito para ficarem tranquilos por conta disso. Sou pai e não consigo nem imaginar o tamanho da dor deles, emano daqui muita força e luz para superarem essa perda que além de irreversível, dificultará suas respirações para sempre.

Uma cidade onde sentir-se seguro é estar preso dentro de escritórios, casas e carros, não me parece uma escolha acertada, comprar essa pseudo-segurança isolando-se dos demais.

É um modelo perverso, que contempla quem tem dinheiro e destrói a cidade e seu sistema público como um todo, empurrando cada vez mais gente para essa sensação bizarra de exclusividade que é ter coisas materiais, e dinamita as relações humanas, precariza a vida nela. Senão vejamos as praças e ruas vazias aos finais de semana, as pessoas vivem com medo delas mesmas, não relacionam-se nem com seus vizinhos, isolam-se em suas fortalezas e deixam a vida passar lá fora.

Nosso país está crescendo a um ritmo acelerado e ao meu ver totalmente desregulado, priorizando o individualismo ao invés da união por meio da educação e convivência, escolas e professores destituídos de investimentos e qualificação são a prova mais concreta disso. Consumo excessivo, sem critério, essa busca estranha por ascensão social, e consequentemente o passaporte para o tenebroso mundo dos vips, esta “raça” medonha de pessoas que frequentam lugares onde de alguma forma encontram um pequeno conforto para suas angústias e temores, mesmo que isso custe a longo prazo construir um fosso de segregação. Sinto muito, mas não é possível viver com exclusividade, não há ineditismo na vida, ela é feita de relações o tempo todo.

Temos o caso de Higienópolis que aconteceu há alguns dias atrás, o medo da tal “gente diferenciada”. Fico pensando como deve ser viver com medo de ir a padaria, viver com medo de ir ao parque, viver com medo de pessoas na rua. Situação triste, muito triste. Não questiono a busca de ninguém por melhores condições de vida, ambição até, o que realmente acho desastroso, é ir aos poucos distanciando-se da vida de verdade, ir afastando-se da vida na cidade como ela é, feita de pessoas em primeiro lugar, mas com problemas e distorções que precisam ser corrigidos com nossas próprias mãos e não por máquinas compradas com um cartão de crédito qualquer em um clube de compras vip.